Agencia Brasil de Fato: (foto arch. ALIA)
Manifestação reúne 1.500 militantes; acampada é atropelada por caminhão na rodovia Anhanguera e morre
Lúcia Rodrigues
da Caros Amigos
enviada especial a Campinas
A marcha do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) em defesa da reforma agrária começou nesta quinta-feira (06). Aproximadamente 1.500 militantes partiram de Campinas, no interior do Estado, no início da manhã, rumo à capital paulista. A
chegada da caminhada está prevista para o próximo dia 10.
Os manifestantes reivindicam o assentamento de 2.400 famílias que estão acampadas no Estado de São Paulo. Maria Cícera Neves, de 58 anos, é uma dessas pessoas que vivem debaixo de uma lona preta há vários anos nos inúmeros acampamentos que existem no Estado.
Perdeu a vida quando lutava por um pedaço de terra. Foi atropelada no quilometro 79 da rodovia Anhanguera, em Vinhedo, no sentido interior-capital, por um caminhão que invadiu o acostamento e a arrastou por alguns metros. A morte foi praticamente instantânea. Segundo o gerente de Operações da Autoban, concessionária que administra a rodovia, Fausto Cabral, o socorro chegou 11 minutos após o atropelamento. 'Quando o resgate chegou, ela já estava morta. Houve perda de massa encefálica', conta.
Para o capitão da Polícia Rodoviária Renan de Oliveira Corte Brilho, que comandou os policiais que acompanhavam a marcha 'ocorreu uma fatalidade'. 'Ninguém tem culpa, nem a organização da marcha, nem a polícia, nem a Autoban.'
A estudante de pedagogia da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) Paula Monteiro testemunhou o acidente. Ela caminhava próximo de Maria Cícera quando ouviu o som de uma buzina intermitente e viu um caminhão avançando sobre os manifestantes
que caminhavam em fila pelo acostamento.
'O motorista desceu com a mão na buzina, atropelou e continuou arrastando. O pessoal batia no caminhão, para ele parar, mas ele não parava' relata a estudante.
Luto na luta
Maria Cícera é mais uma a engrossar a enorme lista dos que tombaram na luta pela terra. Sua morte, no entanto, poderia ter sido evitada se o processo de reforma agrária tivesse saído do papel no Estado de São Paulo.
'O Serra não faz nada pela reforma agrária. Ele é contra a reforma agrária', frisa o dirigente estadual do MST Renê Parrein. Renê conta que em Andradina, município onde está assentado há 10 anos, o governo do Estado já realizou vários despejos.
'Ele (Serra) já despejou várias famílias que vivem em acampamentos à espera da reforma agrária'. Renê afirma que no Pontal do Paranapanema, no extremo oeste do Estado, o governo do PSDB 'está tentando legalizar as terras devolutas (públicas) em
favor dos fazendeiros grileiros que atuam na região'.
'Querem plantar cana, mas os sem terra poderiam produzir alimentos, gerar desenvolvimento, emprego e soberania alimentar', destaca.
A atuação do governo Lula também é criticada pelo dirigente sem terra. 'Dá bilhões e bilhões para o agronegócio e migalhas aos assentados.' Ele também questiona o fato de o governo federal não aplicar o rito sumário (quando a terra é declarada
improdutiva e tem de ser desapropriada) para o avanço da reforma agrária.
'Não avança, não cumpre as metas que foram traçadas', afirma ao se referir ao processo de reforma agrária implementado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
União campo-cidade
Para que a reforma agrária saia do papel, Renê considera fundamental a integração entre os sem terra e os trabalhadores urbanos. 'A classe trabalhadora não tem fronteiras. Precisamos somar forças. A reforma agrária é a melhor saída para o Brasil', ressalta.
Vários sindicalistas e estudantes engrossam a marcha do MST. Para Arley Medeiros, da coordenação nacional da Intersindical, a reforma agrária não é uma bandeira só do MST. 'É uma luta de todos os brasileiros.'
Ele conta que 100 militantes da Intersindical, entre químicos, professores, bancários e metalúrgicos, acompanham os sem terra. 'O MST é o movimento mais ativo do país. A união entre o campo e a cidade é fundamental.'
Arley ressalta ainda que além da luta pela reforma agrária, a integração entre os trabalhadores do campo e da cidade é decisiva para enfrentar a crise econômica. 'Nós queremos superar o capitalismo.'
A coordenadora do DCE (Diretório Central dos Estudantes) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Carolina Filho, concorda com Arley. 'O MST é o principal movimento social da América Latina.' 'Eles não defendem só a reforma agrária, fazem
o enfrentamento ao agronegócio. O MST consegue aglutinar uma série de setores', enfatiza.
A luta continua
A estudante Susi Martinelli, 21 anos, caminhava descalça pela rodovia Anhanguera. Indagada se o calor do asfalto não a incomodava, respondeu que seus pés são calejados. Ela e a família trabalhavam em um sítio arrendado. 'Tirava leite das vacas, sempre andava descalça na roça.'
Susi está acampada há quatro meses no município de Gália, no centro oeste paulista. 'Muita gente difama o MST, taxam a gente de vagabundos porque fazemos passeatas, mas se não fizermos isso, ninguém sabe o que estamos passando. Temos de lutar por um pedaço de terra. Tenho uma filha de dois anos e meio e quero um futuro melhor para ela', ressalta.
Além da conquista de um pedaço de chão, Susi acalenta outro sonho: quer ser médica. 'Estou fazendo cursinho pré vestibular.' Ela ainda não decidiu se quer se especializar em ginecologia ou obstetrícia.
A idade não foi empecilho para Marcos dos Santos Tonon, 13 anos, participar da marcha do MST. Ele vive sob uma lona com a família, no mesmo acampamento em que Susi reside. 'O sonho do meu pai sempre foi ter um pedaço de terra. Antes minha mãe tinha medo, mas depois que conheceu o MST, ela gostou.' O menino foi para a marcha acompanhado pelo irmão mais velho.
Marcos é um aluno dedicado, nunca repetiu, cursa a oitava série em uma escola pública, na região onde vive. Os pais estão desempregados, antes trabalhavam em um sítio cuidando do cultivo de café. 'Trabalhavam na roça e eu também ajudava, quando
voltava da escola', conta.
O menino está confiante que vai conseguir conquistar um pedaço de terra para viver com a família. Hoje, eles sobrevivem com alimentos que são doados ao MST. A casa improvisada tem quarto e cozinha. O banheiro é coletivo, o sonho também."
Manifestação reúne 1.500 militantes; acampada é atropelada por caminhão na rodovia Anhanguera e morre
Lúcia Rodrigues
da Caros Amigos
enviada especial a Campinas
A marcha do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) em defesa da reforma agrária começou nesta quinta-feira (06). Aproximadamente 1.500 militantes partiram de Campinas, no interior do Estado, no início da manhã, rumo à capital paulista. A
chegada da caminhada está prevista para o próximo dia 10.
Os manifestantes reivindicam o assentamento de 2.400 famílias que estão acampadas no Estado de São Paulo. Maria Cícera Neves, de 58 anos, é uma dessas pessoas que vivem debaixo de uma lona preta há vários anos nos inúmeros acampamentos que existem no Estado.
Perdeu a vida quando lutava por um pedaço de terra. Foi atropelada no quilometro 79 da rodovia Anhanguera, em Vinhedo, no sentido interior-capital, por um caminhão que invadiu o acostamento e a arrastou por alguns metros. A morte foi praticamente instantânea. Segundo o gerente de Operações da Autoban, concessionária que administra a rodovia, Fausto Cabral, o socorro chegou 11 minutos após o atropelamento. 'Quando o resgate chegou, ela já estava morta. Houve perda de massa encefálica', conta.
Para o capitão da Polícia Rodoviária Renan de Oliveira Corte Brilho, que comandou os policiais que acompanhavam a marcha 'ocorreu uma fatalidade'. 'Ninguém tem culpa, nem a organização da marcha, nem a polícia, nem a Autoban.'
A estudante de pedagogia da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) Paula Monteiro testemunhou o acidente. Ela caminhava próximo de Maria Cícera quando ouviu o som de uma buzina intermitente e viu um caminhão avançando sobre os manifestantes
que caminhavam em fila pelo acostamento.
'O motorista desceu com a mão na buzina, atropelou e continuou arrastando. O pessoal batia no caminhão, para ele parar, mas ele não parava' relata a estudante.
Luto na luta
Maria Cícera é mais uma a engrossar a enorme lista dos que tombaram na luta pela terra. Sua morte, no entanto, poderia ter sido evitada se o processo de reforma agrária tivesse saído do papel no Estado de São Paulo.
'O Serra não faz nada pela reforma agrária. Ele é contra a reforma agrária', frisa o dirigente estadual do MST Renê Parrein. Renê conta que em Andradina, município onde está assentado há 10 anos, o governo do Estado já realizou vários despejos.
'Ele (Serra) já despejou várias famílias que vivem em acampamentos à espera da reforma agrária'. Renê afirma que no Pontal do Paranapanema, no extremo oeste do Estado, o governo do PSDB 'está tentando legalizar as terras devolutas (públicas) em
favor dos fazendeiros grileiros que atuam na região'.
'Querem plantar cana, mas os sem terra poderiam produzir alimentos, gerar desenvolvimento, emprego e soberania alimentar', destaca.
A atuação do governo Lula também é criticada pelo dirigente sem terra. 'Dá bilhões e bilhões para o agronegócio e migalhas aos assentados.' Ele também questiona o fato de o governo federal não aplicar o rito sumário (quando a terra é declarada
improdutiva e tem de ser desapropriada) para o avanço da reforma agrária.
'Não avança, não cumpre as metas que foram traçadas', afirma ao se referir ao processo de reforma agrária implementado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
União campo-cidade
Para que a reforma agrária saia do papel, Renê considera fundamental a integração entre os sem terra e os trabalhadores urbanos. 'A classe trabalhadora não tem fronteiras. Precisamos somar forças. A reforma agrária é a melhor saída para o Brasil', ressalta.
Vários sindicalistas e estudantes engrossam a marcha do MST. Para Arley Medeiros, da coordenação nacional da Intersindical, a reforma agrária não é uma bandeira só do MST. 'É uma luta de todos os brasileiros.'
Ele conta que 100 militantes da Intersindical, entre químicos, professores, bancários e metalúrgicos, acompanham os sem terra. 'O MST é o movimento mais ativo do país. A união entre o campo e a cidade é fundamental.'
Arley ressalta ainda que além da luta pela reforma agrária, a integração entre os trabalhadores do campo e da cidade é decisiva para enfrentar a crise econômica. 'Nós queremos superar o capitalismo.'
A coordenadora do DCE (Diretório Central dos Estudantes) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Carolina Filho, concorda com Arley. 'O MST é o principal movimento social da América Latina.' 'Eles não defendem só a reforma agrária, fazem
o enfrentamento ao agronegócio. O MST consegue aglutinar uma série de setores', enfatiza.
A luta continua
A estudante Susi Martinelli, 21 anos, caminhava descalça pela rodovia Anhanguera. Indagada se o calor do asfalto não a incomodava, respondeu que seus pés são calejados. Ela e a família trabalhavam em um sítio arrendado. 'Tirava leite das vacas, sempre andava descalça na roça.'
Susi está acampada há quatro meses no município de Gália, no centro oeste paulista. 'Muita gente difama o MST, taxam a gente de vagabundos porque fazemos passeatas, mas se não fizermos isso, ninguém sabe o que estamos passando. Temos de lutar por um pedaço de terra. Tenho uma filha de dois anos e meio e quero um futuro melhor para ela', ressalta.
Além da conquista de um pedaço de chão, Susi acalenta outro sonho: quer ser médica. 'Estou fazendo cursinho pré vestibular.' Ela ainda não decidiu se quer se especializar em ginecologia ou obstetrícia.
A idade não foi empecilho para Marcos dos Santos Tonon, 13 anos, participar da marcha do MST. Ele vive sob uma lona com a família, no mesmo acampamento em que Susi reside. 'O sonho do meu pai sempre foi ter um pedaço de terra. Antes minha mãe tinha medo, mas depois que conheceu o MST, ela gostou.' O menino foi para a marcha acompanhado pelo irmão mais velho.
Marcos é um aluno dedicado, nunca repetiu, cursa a oitava série em uma escola pública, na região onde vive. Os pais estão desempregados, antes trabalhavam em um sítio cuidando do cultivo de café. 'Trabalhavam na roça e eu também ajudava, quando
voltava da escola', conta.
O menino está confiante que vai conseguir conquistar um pedaço de terra para viver com a família. Hoje, eles sobrevivem com alimentos que são doados ao MST. A casa improvisada tem quarto e cozinha. O banheiro é coletivo, o sonho também."
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